A Ar Telecom vai manter a estratégia de diversificação de canais de comercialização, serviços e áreas de atuação.
A área de telecomunicações está em constante evolução, pelo que é preciso dar resposta às novas ameaças e às necessidades das empresas. Quanto à legislação em vigor para o setor, Tiago Oliveira Santos, CEO da Ar Telecom, defende que há ainda melhorias a fazer.
Desde há cerca de um ano que a empresa está integrada no grupo Aire e tem investimentos a decorrer para reforçar o seu posicionamento no mercado nacional.
Vida Económica – Como opera a Ar Telecom no mercado nacional?
Tiago Oliveira Santos - A Ar Telecom sempre teve como principal estratégia a diferenciação através da permanente diversificação das soluções que oferece e dos modelos comerciais praticados. Esta diversificação tem-se concretizado através da convergência do mundo das comunicações tradicionais com as soluções de IT. Esta complementaridade entre o mundo dos serviços de voz e dados e os desafios que os clientes têm na área da cloud, segurança de dados e serviços de IT é essencial para as empresas portuguesas, em particular para as de pequena e de média dimensão, já que é muito menos complexo e mais eficiente gerir estes desafios de uma forma integrada com um só parceiro. O nosso modelo de operação privilegia a utilização de infraestruturas e equipas próprias para garantir o controlo total da qualidade dos serviços prestados. Com a recente aquisição por parte do grupo Aire, estamos a alargar esta estratégia com a expansão da cobertura de rede, o aumento de capacidade da oferta no território nacional, o alargamento da rede de data centers, a aposta nas ligações internacionais de redes de dados e a exportação de serviços para outras geografias.
VE – Qual a atual situação do mercado?
TOS - O mercado de IT e de telecomunicações encontra-se em constante transformação, muito devido à rápida evolução tecnológica, alterações no modelo de trabalho das empresas e até pelas alterações geopolíticas que observamos.
A ascensão de ataques cibernéticos e a transformação digital que as empresas estão a atravessar criam novos desafios para as empresas que trabalham na área de comunicações, cloud, managed services e software de segurança, visto que é necessário desenvolver soluções para ameaças cada vez mais frequentes e com métodos de operação completamente distintos.
Neste sentido, é necessário que as empresas se adaptem e desenvolvam novas formas de conseguir responder a estas novas ameaças e necessidades das empresas.
VE - Quais os principais problemas que se colocam à vossa atividade?
TOS - Não falaria propriamente de problemas, mas de obstáculos que acredito que têm de se ultrapassar para o mercado se desenvolver mais rapidamente e para que as empresas possam incorporar nos seus modelos de negócio soluções mais ambiciosas de comunicações e IT.Destacamos o déficit de competências técnicas no mercado e nos quadros das empresas, que dificulta a tomada de decisões e os respetivos investimentos em digitalização dos negócios.
Apesar de existir um aumento do interesse nos serviços de cloud e de “cybersecurity”, a verdade é que as soluções propostas pelo mercado ainda são complexas, pouco adequadas à dimensão das empresas portuguesas, sendo por isso difíceis de rentabilizar. Estes obstáculos devem ser ultrapassados através de uma resposta do mercado, que tem de oferecer soluções mais ajustadas à realidade das empresas e oferecendo também soluções mais integradas que simplifiquem a incorporação de novas tecnologias nos modelos de negócio das empresas.
Estratégia multifacetada
VE - Qual a estratégia definida para o mercado português?
TOS - A estratégia para o mercado português é bastante multifacetada, desde a diversificação de canais de comercialização, reinvenção de alguns modelos de negócio e continuar a diversificar os nossos serviços e áreas de atuação, aproveitando para tal as sinergias com o grupo Aire.
Tendo a nossa estratégia um elevado nível de maturidade na implementação da convergência entre soluções cloud, serviços IT e de telecomunicações, apostamos agora no reforço da capacidade de crescimento da nossa rede de comunicações, materializada em três principais projetos estratégicos.
O primeiro é um investimento, recentemente realizado, na implementação de uma rede de fibra ótica de elevadíssima capacidade para ligação entre centros de dados em Portugal à Europa.
O segundo projeto estratégico é a implementação de uma rede de muito alta capacidade para acesso local às empresas nos principais centros urbanos, sustentada em infraestruturas dedicadas às necessidades das empresas.
O terceiro é a implementação de um novo “data center” de referência na zona da Grande Lisboa, que é bastante deficitária em infraestruturas desta natureza. Com estes projetos, a Ar Telecom comprometeu já mais de 10 milhões de euros de investimento e estima criar 100 postos de trabalho diretos e 100 indiretos até 2025.
VE - A legislação em vigor para o setor é a adequada?
TOS - Como em tudo na vida, existe sempre espaço para muitas melhorias. Não faz parte da nossa cultura, provavelmente ingenuamente, tomar posições públicas sectárias, mas consideramos que seria determinante para Portugal haver um melhor alinhamento dos diferentes “players” (operadores, prestadores de serviços do setor tecnológico, reguladores e legislador) para a prossecução de objetivos estratégicos para o setor que, na nossa opinião, deveria posicionar o país como aspirante a ser o “Silicon Valley” da Europa.
Numa perspetiva mais prática, existem várias ameaças à nossa competitividade e até à nossa soberania que não foram ainda endereçadas nem pelos reguladores nem pelos legisladores europeus, das quais destacamos a dependência tecnológica da Europa em relação aos grandes players de software dos EUA, setor que claramente devia ser regulado pelo poder de mercado desses players e pela dependência das nossas empresas em relação a essas tecnologias. Os europeus subsidiam indiretamente uma desvantagem competitiva sistémica nesta área e achamos que deveria ser dada muita relevância a esta matéria.
No caso específico do mercado português, destacamos uma fragilidade estrutural relacionada com uma regulação limitada pelas regras europeias, impedindo-a de intervir de uma forma mais assertiva em áreas do mercado que deveriam funcionar melhor e que têm impacto nos consumidores.
Entrevista publicada no jornal Vida Económica, 23 de Junho de 2022.